Quinta-feira eu e a minha amiga PM tivémos almoçinho cultural e fomos conhecer Casa-Museu Dr.Anastácio Gonçalves, mesmo no centro de Lisboa, ao pé da maternidade Alfredo da Costa. Este médico foi um filantropo e coleccionador de obras de arte, uma espécie de mini Gulbenkian (sem que isso tenha nada depreciativo) que legou à cidade de Lisboa, e não só, um espólio de obras de arte (porcelanas/mobiliário/pintura) verdadeiramente notável.
A actual Casa-Museu Dr.Anastácio Gonçalves, um projecto do arquitecto Norte Júnior datado de 1904-05, foi mandada construir pelo pintor José Malhoa para sua casa de habitação e atelier de trabalho. A primeira casa-de-artista da capital, Prémio Valmor em 1905, integrava-se urbanisticamente no plano de crescimento da cidade de Lisboa.
A decoração das fachadas é de grande importância pelo cuidado dado ao pormenor na criação de um ritmo harmonioso e coerente entre os diversos elementos empregues.
Em 1932, a “Casa-Malhoa” é adquirida pelo Dr.Anastácio Gonçalves onde vive e organiza a sua colecção até à data da sua morte (1965). É integrada nos bens do Estado em 1969, por desejo do coleccionador e a Casa-Museu abre ao público em 1980.
José Malhoa (1855-1933)
Retrato do Dr. Anastácio
Gonçalves
Óleo sobre tela
Esta exposição, sobre o coleccionador e filantropo Dr. António Anastácio Gonçalves, é incontornável para a compreensão da constituição das colecções de arte em Portugal no século XX.
Era médico e especializou-se em oftalmologia talvez pelo facto da sua irmã mais velha ser cega. Republicano convicto, participou nas revoltas estudantis republicanas. Já médico, participou na Batalha de La Lys, na I Guerra Mundial, sendo depois agraciado pelos seus feitos voluntariosos enquanto médico. Defendeu valores como a Liberdade, Civismo, Cidadania, Filantropia, Solidariedade com os mais desvalidos, assim como a oportunidade e Igualdade de todos os cidadãos perante a lei, bem como a universalidade no acesso aos cuidados de saúde, à educação pela arte e cultura. A titulo de exemplo, ele tinha um consultório para os mais pobres no Intendente onde quase não cobrava pelos seus serviços e outro na Av. Liberdade para os ricos.
No entanto, a sua figura permanece envolta em mistério. Nunca casou e à parte dos poucos testemunhos de quem o conheceu, o que se sabe sobre a sua vida privada é muito pouco.
A colecção de porcelana da China de 379 peças é, na sua maioria, datável de entre os séculos XVI e finais do XVIII, correspondendo a exemplares provenientes do comércio de porcelana chinesa de exportação. De período anterior existem duas taças, uma Cizhou e outra qingbai datáveis do século XII, Dinastia Song (960-1279), de grande importância artística.
O núcleo principal inicia-se com peças da dinastia Ming (1368-1644) através dum importante grupo de porcelana azul e branca decorada com motivos populares da gramática decorativa chinesa - enrolamentos de flores de lótus e peónias, gamos, dragões, fénix, leões e paisagens - representados em pratos, taças e garrafas datáveis do século XVI correspondendo ao período de domínio português nos mares do Oriente. Existe ainda um pote pintado com o tema das crianças brincando com a marca imperial do imperador Jiajing (1522-1566).
A colecção de pintura portuguesa reunida pelo Dr.Anastácio Gonçalves compreende óleos, aguarelas e desenhos dos séculos XIX e XX num percurso pela temática da paisagem, do retrato e da pintura de costumes.
Narciso
Atribuído a Gustave Courbet.
Estes aquários para carpas são absolutamente fabulosos.
Em termos de mobiliário, exemplares provenientes do estrangeiro apresentam nesta colecção uma significativa importância. Expõem-se peças de origem francesa, inglesa, holandesa, espanhola e mesmo chinesa dos séculos XVII e XIX com as suas particularidades funcionais e decorativas.
Os vitrais art noveau são magníficos.
A sua colecção inicia-se com o núcleo do Romantismo com diversos pintores de referência, verdadeiros marcos da história da pintura nacional, tais como Tomás da Anunciação, Vieira Portuense, Miguel A. Lupi e Alfredo Keil. Contudo, a sensibilidade e os pressupostos estéticos vão-se transformando a partir de meados do século XIX e novas experiências se vislumbram em redor de dois pintores Marques de Oliveira e Silva Porto no anúncio do Naturalismo. A presente colecção tem um importante núcleo de obras de Silva Porto, adquiridas pelo Dr.Anastácio Gonçalves, e actualmente expostas no atelier da Casa-Museu.
Com a viragem para o século XX, a estética naturalista, agora numa expressão Tardo-Naturalista, segue o seu percurso destacado, na presente colecção, em obras de diversos paisagistas, entre os quais se nomeia o pintor Mário Augusto. No núcleo de desenho, a obra gráfica apresentada situa-se cronologicamente no mesmo período, excepção feita a um trabalho de Vieira Lusitano de temática religiosa.
De entre todo o conjunto, evidenciam-se pela importância dos seus autores e qualidade dos desenhos os exemplares de Domingos Sequeira e de Columbano.
Convite à Valsa
Columbano Bordalo Pinheiro
final do séc. XIX
O núcleo de mobiliário português apesar de compreender peças datáveis de entre os séculos XVII e XIX, demonstra a preferência do coleccionador Anastácio Gonçalves pelas obras da época de D.José e de D.Maria I.De entre as obras apresentadas, destaque para os móveis de assento através dos quais se pode conhecer a sua evolução, as suas características específicas na individualização do gosto e sensibilidades nacionais. São exemplos de como a partir de modelos franceses e ingleses, da herança estética portuguesa, da versatilidade da madeira utilizada, o pau-santo, e da perícia dos nossos marceneiros esta tipologia se vai alterando desde os exemplares da 2ª metade do século XVII até aos exemplares dos ambientes burgueses do século XIX.
A casa de banho apresenta já um esquentador, uma verdadeira modernidade para a altura. Uma delicia.
A influência dos modelos europeus e a divulgação da gramática decorativa rocaille transporta-nos para meados do século XVIII onde o trabalho de talha realçada com dourados ou aproveitando as tonalidades contrastantes do claro-escuro da madeira de pau-santo. Também neste período se diversificam as tipologias do mobiliário no interior das habitações, tais como as mesas de encostar, as secretárias, as papeleiras, as cómodas ou os canapés comprovadas nesta mesma colecção.
De realçar, igualmente, o vitral, de origem francesa, encomendado para a da sala de jantar e salinha anexa ao atelier.
Surgem-nos, depois, exemplares da dinastia Qing (1644-1911) com peças do grupo de “família verde” “família rosa” e “azul soprado” assim como um interessante serviço de jantar, datável do reinado Qianlong, com decoração de motivos vegetalistas.
Casa-Museu
Dr. Anastácio Gonçalves
Av. 5 de Outubro, 6-8
1050-055 Lisboa
Tel.: 213 540 823/923
Horários
Terça – 14h00 – 18h00
Quarta a Domingo – 10h00 às 18h00
Taxa de Ingresso
Normal – €3
Pessoas com mais de 65 anos ou menos de 25 anos – €1,50
Portadores de Cartão-Jovem – €1,20
Gratuito aos Domingos e feriados até às 14h00 e para crianças até aos 14 anos, estudantes e professores (mediante comprovativo).
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Se fosse possível, queria a casa de banho, a sala de jantar (com o serviço inteiro) e o vitral para o Natal...
ResponderEliminarAh, mas claro! Não sei é como é que vamos embalar isso, nem se chega a tempo do Natal mas vou fazer o meu melhor. :)
ResponderEliminarAdorei tudo! E acho que ficava tão bem a viver naquela casa!!! Prometo tomar conta de tudo!!! E até recebia os visitantes qual habitante do Palácio de Buckingham....
ResponderEliminarEnquanto director da Casa-Museu fico muito contente do impacte da casa nos visitantes. Visitem-nos no dia 19 de Maio - Noite Internacional dos Museus (ver programa em blog da cmag)
ResponderEliminarCumprimentos,
José Alberto Ribeiro