quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

buenas noches



O meu amigo P. enviou-me este texto e decidi colocá-lo aqui. Também me atrevi a fazer uma tradução livre do mesmo. Espero que gostem tanto como eu.

Miro de reojo el final de la escalera para prolongar mi estancia en el rellano, sin dejar de moverme hacia las sombras del último piso, leo en cada puerta la absurda letra que nos identifica, antes se acompañaba de una placa con el nombre, a veces la profesión, algún referente religioso. Francisco José Gutiérrez Valle; cardiólogo, católico, apostólico y romano, por aquello del Sagrado Corazón atravesado por cuatro espadas y la leyenda supersticiosa que reza ... Dios guarde esta casa ... Ahora Dios trabaja en Securitas Direct vestido de azul marino, gorra de plato y escudo bordado en la solapa con las letras de cualquier superhéroe, sentado frente al panel que ilumina la central de alarmas, con su walkie tolkie respirando interferencias y las ojeras de un perdedor que trabaja de noche para ahorrarse la vida. Sigo subiendo e imagino las historias que se atrincheran detrás de cada letra, individuos descuidados que se creen libres de todas las miradas, diminutos universos donde se representan los guiones teatrales que recogen las voces de nuestro silencio, sólo un tabique separa la desesperanza de la pasión, el sueño de la risa, la muerte de la huida, sólo unos centímetros de pared que nos convierten en únicos. Nos molesta salir al descansillo y encontrarnos con otros actores, descubrir la realidad limitada y saludar con el temor de no ser contestados, la desconfianza de ser agredidos, la alerta que se inicia cuando somos evaluados. Buenas noches, ya es hora de recogerse, de volver al vestuario y quitarnos la ropa del día, el olor de los otros, es hora de sentarse frente al televisor para sentir que el mundo está ahí afuera y no puede alcanzarnos, es hora de dormir y yo acabo de entrar en casa, en el octavo C, al final no he podido evitarlo y he llegado, arrastro el cansancio del esfuerzo y necesito dormir para reponerme y volver a salir temprano, como cada mañana, irremediablemente. Buenas noches.



Olho de soslaio o fim das escadas para ficar um pouco mais no patamar, mas continuo a caminhar até às sombras do último andar e leio em cada porta a absurda letra que nos identifica, antigamente punha-se uma placa com o nome, às vezes a profissão e até referências religiosas. Francisco José Gutierrez Valle; cardiologista, católico, apostólico e romano, aquele do Sagrado Coração atravessado por quatro espadas e o chavão supersticioso ...Deus Guarde Esta Casa... Agora Deus trabalha na Securitas Direct, vestido de azul marinho, boné e emblema bordado na lapela como se fosse um super herói, sentado em frente ao painel que ilumina a central de alarmes, com o seu walkie talkie respirando interferências e com as olheiras de um falhado que trabalha à noite para ganhar a vida. Continuo a subir e imagino as histórias que se amontoam por de trás de cada letra, indivíduos descuidados que se acham impunes a todos os olhares, pequenos universos onde se representam peças de teatro que aspiram as vozes do nosso silêncio, apenas uma fina parede separa o desespero da paixão, o sonho do riso, a morte da fuga, apenas uns centímetros de parede que nos tornam únicos. Chateia-nos ir ao vão de escada e encontrarmos os outros, descobrir a realidade limitada, cumprimentá-los com o medo de não sermos respondidos, a desconfiança da hostilidade, o alerta que dispara quando somos avaliados. Boas noites, já são horas de regressar, de chegar ao quarto e despir a roupa do dia, o cheiro dos outros, chegou a hora da nos sentarmos em frente à televisão para apenas sentir que o mundo continua vivo lá fora, mas não nos pode atingir, é hora de dormir e eu acabo de entrar em casa, no oitavo C, afinal não consegui evitar e acabei mesmo por vir para casa, arrasto o cansaço do esforço, preciso de dormir para me recompor e voltar a sair de manhã cedo, como todas as manhãs, irremediavelmente. Boas Noites.

2 comentários:

  1. muito obrigado pela traduçâo e por sua opiniâo
    P.

    ResponderEliminar
  2. Angustiou-me o estado de espírito de P. quando escreveu este texto. Soube depois que tinha sido há algum tempo. Para mim, reflecte um pouco a sua vivência profissional para além da individual que nos assalta a todos (os que têm a mania que pensam!!!). Pensei na carga que será arrastar, para além dos problemas do quotidiano, ainda os dos pacientes. Dá-nos concerteza uma outra perspectiva da vida, tal como no caso do A.

    ResponderEliminar